No Brasil, um total de 6 milhões de crianças estão com excesso de peso. O dado, coletado pelo Ministério da Saúde por meio dos atendimentos infantis nas Unidades Básicas de Saúde (UBS), chamou a atenção da pasta, que lançou a Campanha Nacional de Prevenção à Obesidade Infantil.
Os números mostram ainda que o sobrepeso atinge 15% das crianças de até 5 anos. Na faixa de 5 a 9 anos e entre os adolescentes, a porcentagem é ainda maior: 31%.
Maria Alvim, pesquisadora do Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde da Universidade de São Paulo (Nupens/USP), ressalta que a obesidade já é problema de saúde pública global. Para crianças, as consequências são ainda maiores. “Aumenta o risco de doenças crônicas precocemente, como diabetes, distúrbios de sono, hipertensão e até alguns tipos de câncer“, explica.
“São doenças que a gente só discutia com adultos. Temos visto, no entanto, que isso acontece com crianças e pode resultar também no adoecimento precoce e até na mortalidade precoce, por conta dos excessos, e em uma redução na qualidade de vida”, avalia a especialista.
O Ministério da Saúde assinou duas portarias que destinam R$ 90 milhões para ações de combate ao problema. A primeira delas institui a Estratégia Nacional de Prevenção e Atenção à Obesidade Infantil (Projeta), para desenvolver iniciativas nos estados, municípios e no DF.
A segunda libera três parcelas de R$ 31,9 milhões, durante três anos, para cidades de até 30 mil habitantes que registraram sobrepeso em mais de 15% das crianças menores de 10 anos. “Os municípios que se encaixarem nos critérios estipulados pelo texto podem fazer adesão ao incentivo financeiro a partir de terça-feira (17/8)”, informou o ministério.
A influência da pandemia
Para o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, o fato de as crianças estarem fora da escola e em isolamento social por conta da pandemia de Covid-19 pode ter contribuído para o ganho de peso.
“As crianças diminuíram o deslocamento ativo, os exercícios físicos, a interação com outras crianças e aumentou muito o tempo de tela”, declarou Queiroga. “Os pais devem incentivar esse gasto de energia e se for fora de casa que seja consciente com máscara e álcool”, diz Maria Alvin, reforçando a fala do ministro.
De acordo com um estudo divulgado pela SuperAwesome, empresa americana de tecnologia em mídia digital, crianças entre 6 e 12 anos passaram cerca de 50% do tempo de quarentena em frente às telas, ou seja, metade do dia. Os pesquisadores afirmam que o tempo gasto com celulares, tablets, computadores e a boa e velha TV aumentou entre duas e três vezes em relação ao consumo habitual.
Classe social
Segundo o conselho fiscal da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica, a obesidade é também relacionada à classe social. Apesar de o número ter crescido em todas as faixas salariais, as mais baixas apresentaram índices mais alarmantes. As classes C, D e E tiveram, cada uma, um crescimento de 5 pontos percentuais no nível de obesidade. Em relação à quantidade, a classe C representa a maior parcela da população obesa, com 23%. Na classe A, a alta foi menor, de 2 pontos percentuais, e chegou a 16% do total.
“As classes socioeconômicas mais baixas são mais suscetíveis às propagandas dos alimentos. As pessoas têm menos noção do prejuízo”, diz Maria Alvim. De acordo com ela, a questão da praticidade também é muito vendida pelo marketing e “pessoas com muito tempo de deslocamento para chegar no trabalho, por exemplo, optam pela facilidade”.
O bullying como fator
A psicopedagoga Wania Emerich Burmester afirma que para uma criança aprender de forma saudável e ativamente é necessário que ela esteja bem, emocionalmente e fisicamente saudável. “A obesidade afeta a autoestima da criança e isso com certeza afeta a aprendizagem. Afinal, o aluno fica mais inibido, pergunta menos, já que quer se expor menos.”
Além disso, a especialista diz que a situação acaba virando uma “bola de neve”. “Ela tem uma perda em todos os âmbitos, e, conforme isso vai ficando mais intenso, é mais difícil lidar, vai aumentando a ansiedade e ela não consegue se controlar”, acrescenta.
Wania Emerich diz ainda que é importante que esse trabalho seja feito de uma maneira constante e que deveria haver um plano escolar para evitar o bullying. “Ter rodas de conversas, um diálogo bem estabelecido dentro das escolas, que os alunos possam falar sobre as suas ansiedades, questões e angústias. Isso acaba mostrando que todo mundo tem o seu ponto fraco e problemas.”
Fonte: Metrópoles