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A polêmica da pílula azul

A capa mais recente de ÉPOCA _sobre a nova pílula usada no combate ao HIV_ provocou a manifestação de dezenas de leitores diretamente à revista e tornou-se uma das mais comentadas e compartilhadas nas redes sociais.

A reportagem informava sobre o início da distribuição no Brasil da PrEP, Profilaxia Pré-Exposição, pelo Sistema Único de Saúde (SUS), iniciada em dezembro do ano passado. Aproveitava a chegada do medicamento à rede pública de saúde para discutir a prevenção contra o vírus HIV em contexto nacional e global.

Capa Revista Época Ed 1031 Home (Foto: Época)

A abordagem gerou críticas de instituições como o Ministério da Saúde, que afirmou que “a principal premissa da matéria”, o abandono da camisinha por causa da PrEP, “não encontra respaldo em nenhum estudo científico” e que “a revista reforça estigmas há muito superados” pelo enfoque dado aos homossexuais masculinos. Associações e entidades de apoio às causas LGBT e aos soropositivos, assim como leitores em mensagens, enviaram críticas em tom semelhante.

Leitores interpretaram como preconceituosos trechos da reportagem. Alguns reclamaram de tom sensacionalista ao narrar comportamentos promíscuos em casas noturnas.  Um leitor apontou que ela reforça o estereótipo sobre a população LGBT, estigmatizando-a. Outro viu moralismo no texto por supostamente condenar sexo entre múltiplos parceiros.  “A reportagem é interessante, mas não deixa de reproduzir alguns preconceitos usuais e não se dedica muito a esclarecê-los”, escreveu outro dos leitores. “Essa matéria é um desserviço à sociedade brasileira. Me entristece! Seguimos em luto e em luta pra construir um Brasil menos preconceituoso e mais justo para todos! Repudio integralmente esse tipo de jornalismo que só reforça estereótipos”, reclamou um terceiro.

Houve leitores, no entanto, que culparam o politicamente correto por evitar debater que a “incidência de HIV em homens gays é absurdamente maior que nos outros estratos, inventando que não existe grupo de risco”.

Por fim, um dos médicos ouvidos para a reportagem postou comentário em rede social no qual afirma ter se arrependido da entrevista que concedeu. Ricardo Vasconcelos escreveu  que o texto da revista está “repleto de equívocos que reforçam estigmas sobre temas que já estão soterrados de preconceitos, como por exemplo o fato analisado com julgamento moral de que gays são promíscuos, ou que somente os gays precisam se preocupar com HIV. Informa de maneira errada sobre o que é PrEP e PEP, troca nomes de entrevistados e joga no lixo tudo o que conversamos em horas de explicação.” O médico afirmou, ainda, que os entrevistados pela revista têm risco de terem seu depoimento deturpado.

ÉPOCA reproduziu com fidelidade as declarações de Vasconcelos, checada por escrito pelo autor da reportagem. A revista discorda do julgamento que o médico faz do trabalho jornalístico, mas reconhece erros pontuais no texto, que não alteram a essência do trabalho. Esses erros estão corrigidos abaixo.

A revista esclarece que priorizou o debate sobre a mudança de comportamento entre homossexuais masculinos porque nesse estrato houve aumento dos casos de infecção nos últimos anos, conforme dados oficiais. De acordo com o último boletim epidemiológico do Ministério da Saúde, publicado no ano passado, os índices dos casos de aids chegaram a quase triplicar entre jovens do sexo masculino (na faixa dos 15 aos 19 anos). Entre 2007 e junho de 2017, mais de 58% dos casos de infecção por HIV entre homens acima de 13 anos se deu por algum tipo de exposição homossexual. O índice de prevalência do HIV em homossexuais e bissexuais masculinos acima dos 25 anos chega a 19,8%. Na população em geral está em 0,4%.

O Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para Profilaxia Pré-Exposição (PrEP) de risco à infecção pelo HIV, publicado em 2017 pelo Ministério da Saúde, elenca os homossexuais e homens que fazem sexo com homens, pessoas transgênero, profissionais do sexo e casais sorodiscordantes _no qual apenas um dos parceiros é soropositivo_ como grupos de atendimento prioritário. O documento afirma que “determinados segmentos populacionais, devido a vulnerabilidades específicas, estão sob maior risco de se infectar pelo HIV”.

De acordo com o Ministério da Saúde, um dos grandes desafios da prevenção no Brasil é que o país possui uma “epidemia concentrada” de HIV entre alguns segmentos populacionais (chamados de populações-chave ou prioritárias) e em algumas regiões do país. São consideradas populações-chave: pessoas que usam álcool e outras drogas, pessoas trans (travestis e transexuais), gays e outros homens que fazem sexo com homens (HSH), trabalhadoras do sexo e pessoas privadas de liberdade.

ÉPOCA reforça que, em nenhum momento, a reportagem relaciona a PrEP ao aumento dos casos de HIV/aids, assim como não há qualquer afirmação de que o novo medicamento é o responsável pela queda no uso da camisinha. O texto elenca outras formas de prevenção ao HIV, de acordo com o Ministério da Saúde, e esclarece que todos os usuários da PrEP pelo SUS devem fazer acompanhamento médico trimestral, inclusive para testagem de infecções sexualmente transmissíveis.

A reportagem também não afirma que gays e bissexuais masculinos são promíscuos nem faz qualquer juízo de valor sobre os personagens apresentados. Todos os usuários da PrEP retratados demonstraram ter uma vida sexual consciente no que diz respeito ao uso de diferentes tipos de prevenção e em diálogo com seus parceiros, dentro das orientações médicas e dos protocolos contemporâneos de combate ao HIV.

Além de médicos especialistas, as principais fontes consultadas para a reportagem foram os boletins e guias do Ministério da Saúde, da Organização Mundial de Saúde, do Centers for Disease and Prevention dos Estados Unidos e artigos de estudos demonstrativos publicados em revistas como The Lancet, especializada em artigos médicos. Entre os artigos citados e publicados na revista americana está o do PrEP Brasil, publicado em fevereiro.
Muitas das postagens nas redes sociais apenas endossavam críticas, reproduzindo supostos erros e pontos de vista que nunca constaram do texto original. Para quem quer saber o que foi publicado, a reportagem está aberta aqui a todos leitores.

CORREÇÕES
A reportagem de capa da última edição de ÉPOCA, intitulada “A outra pílula azul”, informou erroneamente em seu oitavo parágrafo (pág. 36) que a PrEP (Profilaxia Pré-Exposição) é “como uma pílula do dia seguinte, que deve ser usada em até 72 horas após uma relação de risco ao longo de 28 dias”. Na verdade, essa definição se refere à PEP (Profilaxia Pós-Exposição), disponibilizada pelo Sistema Único de Saúde desde 2010. A PrEP, tema principal da reportagem, consiste no uso diário do medicamento antirretroviral Truvada para impedir, de forma preventiva, a infecção do organismo pelo HIV. O comprimido azul-claro é distribuído pelo SUS desde dezembro.

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Na mesma reportagem, foram trocadas as legendas de duas fotos. O jovem que aparece na foto da página 36 é Felipe Lopes Ferreira. Na página 38, o fotografado é Yuri Buzo.

 

Fonte:Epoca

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