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Bastidores: como a transmissão própria de dois jogos virou polêmica no Flamengo

Foi uma semana de montanha-russa no Flamengo. Da euforia pela transmissão na Fla TV à frustração da experiência com o MyCujoo, o clube viveu dias de intenso debate. Torcedores que celebraram a exibição do jogo contra o Boavista reagiram mal quando o clube resolveu cobrar R$ 10 de não sócios pela semifinal contra o Volta Redonda. Nos bastidores, dirigentes se decepcionaram com a receita da primeira partida e correram para testar um modelo de pay-per-view, mas a decisão foi muito criticada dentro e fora do clube.

Os questionamentos aumentaram quando a plataforma se revelou incapaz de suportar o volume de acessos simultâneos. Sem alternativa, o presidente Rodolfo Landim voltou atrás e, nove minutos antes do jogo, decretou a abertura do sinal nas redes sociais.

Tudo começou na quarta-feira. Baseado na Medida Provisória 984, o Flamengo transmitiu a partida contra o Boavista de graça em suas páginas no YouTube e no Facebook para o Brasil. O time de Bacaxá é um dos 11 do Carioca que tinham contrato com a Globo. A emissora rescindiu o compromisso na quinta-feira, já que o contrato foi assinado sob a vigência da lei anterior e previa que clubes mandante e visitante deveriam estar de acordo para a exibição do jogo.

A transmissão nas redes sociais do Flamengo alcançou pico de 2,1 milhões de visualizações simultâneas, tornando-se a exibição de jogo ao vivo do futebol brasileiro com maior audiência no YouTube. Porém, audiência e arrecadação ficaram abaixo do que imaginavam os dirigentes rubro-negros.

No confronto com o Boavista, o Flamengo arrecadou pouco mais de R$ 800 mil e teve exposição bem menor do que Botafogo x Portuguesa, disputado no mesmo horário. A receita foi obtida através de patrocínios, doações e pagamentos no MyCujoo (através do qual mil pessoas viram a partida fora do país, pagando US$ 8 ou R$ 42). Descontados os custos de transmissão, o clube levou pouco mais de R$ 500 mil.

– A gente agradece muito a quem participou da última transmissão e fez os pagamentos, eles ajudaram. Mas, falando francamente, o valor arrecadado foi pequeno – disse Landim à Fox Sports no sábado.

Debate sobre o modelo

Depois do jogo de quarta, surgiu um debate na cúpula rubro-negra: valia a pena repetir a estratégia na semifinal da Taça Rio ou o clube deveria testar um meio de buscar receita direta? Dirigentes consideravam fundamental buscar um número relevante para impactar negociações futuras.

Se fosse possível cobrar um “ingresso barato” de 20% dos 2,2 milhões que passaram pela Fla TV, o clube teria um número expressivo (poderiam ser R$ 4 milhões brutos). O clube chegou a discutir usar uma plataforma mais robusta, mas não havia tempo hábil. Optou-se então pelo MyCujoo, porque a experiência tinha funcionado para o exterior.

A plataforma de transmissão sediada em Portugal transmite ligas de pequeno porte pelo mundo. Para esta segunda-feira, por exemplo, está prevista a exibição ao vivo do jogo entre Khukh Chononuud e DMU, pela Segunda Divisão da Mongólia. No Brasil, o MyCujoo tem parceria com a CBF para transmissão de torneios como a Série D do Brasileiro, o Brasileiro Feminino e competições de base.

A corrente que defendia a cobrança para os não sócios no jogo contra o Volta Redonda foi liderada por dois vice-presidentes: o de Relações Externas, Luiz Eduardo Baptista (BAP), e o de Finanças, Rodrigo Tostes. Eles ganharam o aval de Rodolfo Landim, que bateu o martelo na sexta-feira.

O controverso anúncio

O anúncio da decisão foi feito por Tostes pouco depois das 20h de sexta na Fla TV, o que também causou desconforto em outros dirigentes, que ainda discutiam a melhor forma de fazer o comunicado à torcida.

O impacto negativo foi imediato. Influenciadores que nos últimos meses defenderam todas as decisões da diretoria fizeram críticas públicas e se disseram traídos. A rejeição enfática e quase unânime nas redes sociais e nos grupos de WhatsApp surpreendeu a diretoria – que saboreava imensa popularidade desde o espetacular sucesso do futebol em 2019.

Com as críticas externas, cresceu também a resistência no clube à decisão de cobrar pela exibição da semifinal. No sábado – dia em que o muro da Gávea amanheceu com a pichação “Fora Landim ganancioso” -, já havia dirigentes que defendiam a mudança nos planos, mas o presidente bateu o pé em entrevista à Fox Sports.

– A gente sempre sabe que tem uma reação natural quando se cobra qualquer coisa, mas infelizmente o clube precisa viver de receita. A gente precisa arrecadar para manter o nosso time.

Chuva de reclamações

No domingo, a situação piorou. Alguns sócios reclamavam de não receber e-mail de confirmação. Outros diziam ter recebido e não conseguiam acessar. Nas redes sociais, centenas de pessoas relatavam desde cedo que não conseguiam pagar ou acessar o MyCujoo. Para pagar os R$ 10 (R$ 9,96 mais precisamente), o aplicativo fazia uso de uma plataforma terceirizada de pagamentos, que começou a travar.

A indignação dos torcedores aumentou e chegou aos grupos de dirigentes do Flamengo. A pressão pela liberação gratuita do jogo cresceu. Pouco depois das 13h, o clube postou no Facebook que transmitiria o jogo com imagens na Fla TV. O post, porém, foi rapidamente apagado. Às 14h47, o MyCujoo informou no Twitter que agia para conseguir resolver o problema de pagamentos. Era tarde.

– O grande problema foi com a plataforma de pagamento, com uma empresa que se chama Ebanx, que é nossa parceira. Com o MyCujoo deu tudo certo, mas o torcedor não conseguia entrar e pagar. Ficava dando falha, falha, falha – disse ao GloboEsporte.com o CEO do MyCujoo, Terence Gargantini.

Minutos antes do jogo, parentes de dirigentes da cúpula do clube reclamaram que não conseguiam acessar a plataforma para ver a semifinal. O time já havia entrado no gramado do Maracanã quando, às 15h51, Rodolfo Landim mandou a mensagem em grupos de WhatsApp dos quais faz parte: “Avisem a todos. Mandei liberar o sinal da Fla TV”.

Comunicação em silêncio

A mensagem demorou a chegar ao departamento de comunicação do clube. Quando o jogo começou, nenhuma rede social do Flamengo havia informado sobre a liberação das imagens gratuitamente na Fla TV. Apenas às 16h20, um minuto antes do primeiro gol de Bruno Henrique, o clube fez o anúncio no Twitter.

Com a decisão de Landim, os torcedores que pagaram R$ 10 para ver a semifinal no MyCujoo receberão o dinheiro de volta. O CEO da plataforma considerou “superbacana” a parceria com o Flamengo.

– A gente avalia que teve um superssucesso. A gente fechou essa parceria na sexta à noite, então nós tivemos menos de 48 horas para entregar soluções de pay per view e solução para o sócio não pagar ingresso. Foi bem pertinho de 100 mil pessoas (vendo o jogo na plataforma) – afirmou Terence Gargantini.

No YouTube, com pico de 1,8 milhão de acessos simultâneos, o jogo de domingo alcançou audiência menor do que o de quarta, embora tivesse mais importância. Os números não foram fechados, mas, com a devolução do dinheiro dos torcedores que pagaram para ver no MyCujoo, o clube estima arrecadação consideravelmente menor do que a da partida contra o Boavista.

Depois do jogo, Landim e Gargantini citaram número aproximado de 100 mil pessoas vendo o jogo na plataforma. Ainda que todos tivessem pago R$ 10, a arrecadação do Flamengo – caso não houvesse a devolução do dinheiro – seria de R$ 1 milhão brutos, antes do percentual do MyCujoo (20%) e de impostos. Clube e plataforma não divulgaram quantos dos 100 mil usuários eram sócios e quantos pagaram.

Presidente elogia iniciativa

De toda forma, Rodolfo Landim aprovou a estratégia. Em entrevista à Fla TV depois da vitória sobre o Volta Redonda, o presidente considerou a iniciativa inicial um sucesso e reforçou que, em sua visão, não houve erro no planejamento.

– O sucesso foi tão grande que acabou criando um gargalo no processo de análise de pagamento da plataforma. (…) É importante mostrar que a estratégia não estava errada. Havia uma demanda muito grande, mas o fato é que a gente precisa operacionalmente evoluir, faz parte do processo de aprendizado.

Dentro do clube, a declaração do presidente minutos após a classificação à final da Taça Rio mostrou que a questão da transmissão na semifinal não estava encerrada. Chamou a atenção de integrantes da diretoria a ausência de um pedido de desculpas à torcida na entrevista de Landim.

Com a transmissão da semifinal ainda causando polêmica no clube, o Flamengo volta suas atenções nesta segunda, às 10h, para o sorteio do mando de campo da final da Taça Rio contra o Fluminense. Se for mandante, a diretoria rubro-negra começará a planejar como fará a exibição da decisão.

Fonte: Globo Esporte
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