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Conselheira do TCE manda suspender contratação de organizações sociais para administrar hospitais

A pedido do procurador-geral do Ministério Público de Contas (MPC), Márcio André Madeira de Vasconcelos, no âmbito de representação, a conselheira Waltânia Leal, vice-presidente do Tribunal de Contas do Estado do Piauí (TCE-PI), concedeu medida cautelar para determinar ao secretário de Saúde Antônio Luiz Soares Santos “que suspenda imediatamente” os processos de contratação de Organização Social (OS) para administrar o Hospital Estadual Dirceu Arcoverde (HEDA) em Parnaíba, o Hospital Regional de Campo Maior e a Unidade de Saúde Integrada do Mocambinho (UIM), em Teresina, até que sejam comprovadas perante a Corte de Contas a prévia aprovação de tais contratações pelo Conselho Estadual de Saúde do Estado do Piauí (CESPI), como manda a lei. Os editais de abertura estavam previstos para ocorrer neste dia 12 de junho de 2023.

A conselheira também decidiu que a pasta da Saúde deve cumprir as seguintes determinações:

1 – Demonstre, por meio de ato ou procedimento previamente realizado para esse fim, os fundamentos/critérios que justifiquem técnica e juridicamente o montante dos valores estimados de despesas operacionais mensais utilizados nos editais correspondentes aos chamamentos públicos 01/2023, 02/2023 e 03/2023.

2 – Comprove que a transferência de serviços públicos essenciais de saúde está prevista no Plano Plurianual – PPA, na Lei de Diretrizes Orçamentárias – LDO e na Lei Orçamentária Anual – LOA;

3– Demonstre que o pagamento à Organização Social será feito na proporção dos valores até então gastos por cada unidade de saúde cuja gestão será transferida ao particular, evitando a utilização de recursos que eram destinados às demais unidades de saúde;

4 – Comprove, mediante ato ou procedimento previamente realizado para esse fim, a vantajosidade econômica e operacional da terceirização, ou seja, evidencie que os custos envolvidos na prestação dos serviços nos moldes contratados são inferiores à execução direta ou, em outras palavras, que a atividade executada pela contratada irá gerar um dispêndio menor de verbas públicas e ainda possibilitará maior eficiência nas ações e serviços públicos de saúde;

5 – Demonstre que o valor das despesas com pessoal suportadas pela Secretaria de Saúde, no caso de servidores cedidos com ônus, corresponde ao valor da glosa de repasses previstos às Organizações Sociais nos respectivos editais;

6 – Apresente inventário e tombamento de bens públicos, móveis e imóveis, que serão cedidos às Organizações Sociais em cada contrato de gestão.

Além de que determinou a integrante do TCE “que, após a prévia aprovação de tais contratações pelo Conselho Estadual de Saúde do Estado do Piauí – CESPI e o cumprimento das determinações listadas (…), PROCEDA à republicação dos respectivos Editais e Termos de Referência, bem como sua disponibilização integral nos sítios eletrônicos da SESAPI e no sistema Licitações WEB desta Corte de Contas, inserindo as seguintes cláusulas referentes às obrigações da ORGANIZAÇÃO SOCIAL contratada:

– Fixação de limite de 60% dos recursos repassados com remuneração, encargos e vantagens pagos a dirigentes, empregados e servidores cedidos, de forma a impedir que os recursos financeiros a serem transferidos sejam aplicados em pessoal em patamar imoderado;

–  Contratar, mediante processo seletivo, sob o regime da CLT, profissionais técnicos e administrativos em quantidade necessária e condizente ao adequado cumprimento das atividades e serviços inerentes aos objetos das parcerias, valendo-se, para essa finalidade, dos mecanismos que se fizerem necessários, observados os princípios da impessoalidade, da moralidade, da boa-fé, da probidade, da economicidade, da eficiência, da isonomia, da publicidade e do julgamento objetivo;

–  Apresentar à SECRETARIA DE SAÚDE, com periodicidade mensal, para fins de verificação do cumprimento das obrigações trabalhistas e previdenciárias, a seguinte documentação: Folhas de pagamento dos empregados (pessoal e dirigentes) admitidos ou mantidos com recursos do contrato de gestão, indicando, no mínimo, a função desempenhada, data de admissão e a discriminação da composição dos valores pagos, em formatos sintéticos e analíticos; Relação de servidores/funcionários cedidos, indicando, no mínimo: nome, CPF, cargo, função, matrícula e remuneração, com a discriminação da composição de valores e da fonte de pagamento; Certidões negativas de débitos perante a Fazenda Estadual, o Instituto Nacional de Seguro Social (INSS), o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), bem como relação de demandas que figure como réu, além de decisões judiciais que lhe forem desfavoráveis e os valores das respectivas condenações;

– Vedar expressamente a contratação de pessoal por meio de interposta pessoa jurídica (“Pejotização”), por constituir burla às regras trabalhistas, previdenciárias e tributárias, bem como por causar sérios riscos diante da responsabilidade subsidiária do Estado;

– Exigir no regulamento próprio de contratações de obras e serviços, bem como para compras com emprego de recursos provenientes do contrato de gestão, vedação de contratação de produtos, serviços ou insumos superiores aos preços atualmente contratados pela SESAPI, observando-se, ainda, o banco de preços do Ministério da Saúde e as cotações previstas no sistema ComprasNet;

– Exigir no regulamento próprio de contratações de bens e serviços com recursos oriundos do contrato de gestão, a previsão de realização de, no mínimo, 03 (três) cotações prévias de preços no mercado;

– Exigir a manutenção e o efetivo funcionamento de Portais de Transparência para cada unidade de saúde transferida mediante contrato de gestão, contendo, no mínimo: Contratos de gestão na íntegra e aditivos; Propostas de Trabalho; Relatório de metas e resultados alcançados; Relatórios Financeiros; Relatórios mensais de execução dos contratos de gestão; Relatórios de Fiscalização e Pareceres da Comissão de Avaliação; Divulgação do Balanço Patrimonial; Regulamento de Contratação; Registro das despesas executadas; Inventário de bens públicos cedidos pela Secretaria de Saúde; Listagem de contratos existentes com fornecedores, com os respectivos preços unitários; Divulgação dos processos de seleção de pessoal, bem como seus resultados; Relação de pessoal contratado pela Organização Social e dos servidores públicos cedidos, com a respectiva remuneração; Disponibilização de meios eletrônicos para o fornecimento de denúncias, críticas e sugestões pelos usuários acerca dos serviços prestados pela Organização Social”.

O QUE SUSTENTOU O MPC

Segundo o procurador-geral do Ministério Público de Contas, “a partir de consulta aos sistemas internos desta Corte de Contas, o MPC verificou que os referidos editais, com data de abertura prevista para o dia 12/06/2023, possuem irregularidades que afrontam o ordenamento jurídico constitucional e os princípios norteadores do Sistema Único de Saúde e do Regime Jurídico de Direito Público”.

E que “tais procedimentos, na qualificação e seleção das organizações sociais para a formalização do contrato de gestão, apresentam falhas que podem comprometer a efetividade das ações propostas, bem como a transparência e fiscalização dos serviços públicos de saúde transferidos à iniciativa privada”.

Alegou há “ausência de estudo detalhado que contemple a fundamentação da conclusão de que a transferência do gerenciamento para as organizações sociais mostra-se como a melhor opção e ausência de avaliação precisa dos custos do serviço e dos ganhos de eficiência esperados, bem como ausência de planilha detalhada com a estimativa dos custos a serem incorridos na execução do contrato de gestão”.

Argumentou “que não há a demonstração das vantagens de economicidade ou produtividade na adoção do modelo de gestão por organização, assim como não ficou comprovada a impossibilidade de ampliação de tais serviços pelo Poder Público, condição fundamental”;

Informou “que quando da apresentação da intenção da Secretaria de Saúde do Estado do Piauí, na 281ª Reunião Ordinária do Conselho Estadual de Saúde do Piauí, o Pleno do CES/PI, à unanimidade, não aprovou a proposta de Contrato de Gestão com Organização Social (OS) para administrar os hospitais do estado do Piauí”.

Sustentou assim, “que a negativa do Conselho Estadual de Saúde torna as referidas contratações irregulares por serem contrárias às determinações da Lei Estadual nº 6.036/2010”.

Além de que há “ausência nos editais das informações necessárias para subsidiar a elaboração do plano operacional”.

Destacou “falha na fase de execução, pois não foram postos nos contratos de gestão os critérios mínimos a serem observados pelas Organizações Sociais na elaboração dos seus respectivos regulamentos de contratação de obras e serviços, assim como para compras de quaisquer bens com emprego de recursos provenientes do Poder Público, em respeito aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, economicidade e eficiência”.

Apontou “que os editais e termos de referência não exigem uma periodicidade mínima no envio de informações essenciais para que se fiscalize de modo concomitante a execução dos contratos de gestão”.

Salientou “a necessidade de maximização da transparência na execução dos contratos de gestão para possibilitar o efetivo controle”.

É o que consta da decisão da conselheira, que atendeu os pedidos do MPC.

STF E LEI ESTADUAL

Na decisão monocrática de Waltânia Leal ela diz ser “importante mencionar que Supremo Tribunal Federal, por meio da ADIN 1.923, transitada em julgado em 04.02.2016 (Rel. para Acórdão Min. Luiz Fux, julgado em 16.04.2015, DJe 17.12.2015), concedeu interpretação conforme a Constituição à Lei nº 9.637/98 (Dispõe sobre a qualificação de entidades como Organizações sociais), indicando parâmetros objetivos acerca da qualificação/contratação das entidades privadas e para medição do desempenho, por Organizações Sociais, de atividades nas áreas de “serviços públicos sociais”.

Acresceu que o Ministério Público de Contas “apontou, entretanto, que as Chamadas Públicas nº 01/2023, nº 02/2023 e nº 03/2023 da SESAPI não evidenciaram no processo de transferência do gerenciamento dos serviços de saúde para organizações sociais o que segue:a) estudo detalhado que contemple a fundamentação da conclusão de que a transferência do gerenciamento para organizações sociais mostra-se a melhor opção; b) avaliação precisa dos custos do serviço e dos ganhos de eficiência esperados; e, c) planilha detalhada com a estimativa de custos a serem incorridos na execução do contrato de gestão”.

Afirmou a conselheira que “não há, de maneira inequívoca, decisão solidamente fundamentada, demonstrando as vantagens de economicidade ou produtividade na adoção do modelo de gestão por organização, em vez de fomentar a atividade pública por ação governamental direta, com apresentação de documentação que demonstre e comprove a opção realizada. Tampouco foi comprovada a necessidade e a impossibilidade de ampliação de tais serviços pelo próprio Poder Público”.

Que “foi apontada, ainda, a inobservância ao disposto no art. 1º, §2º, da Lei Federal nº 8.142/1990 (Dispõe sobre a participação da comunidade na gestão do SUS) c/c art. 2º, §3º da Portaria MS/GM nº 1.034/2010, que condiciona a necessidade de complementação de serviços de assistência à saúde à aprovação pelo Conselho de Saúde e constar do Plano de Saúde respectivo, uma vez que a proposta de Contrato de Gestão com Organização Social (OS) para administrar os hospitais do estado do Piauí da Secretaria de Saúde do Estado do Piauí não foi aprovada, à unanimidade pelo Pleno do Conselho Estadual de Saúde do Piauí – CES/PI, conforme Resolução CESPI 005/20231”.

“Ademais, referidas contratações feriram o art. 1º, inciso IV da Lei Estadual n° 6.036/20102 , posto que é NECESSÁRIA a DELIBERAÇÃO E APROVAÇÃO de contratações do terceiro setor pelo Conselho”, pontuou Waltânia Leal.

A conselheira do TCE disse ainda que “resta evidenciado o fumus boni juris, uma vez que, consoante o relatado (…), as Chamadas Públicas nº 01/2023, 02/2023 e 03/2023, que têm como objeto o gerenciamento, a operacionalização e a execução de ações e serviços de saúde, encontram-se eivadas de vícios que afrontam o ordenamento jurídico constitucional, os princípios norteadores do Sistema Único de Saúde e do Regime Jurídico de Direito Público, bem como a legislação pertinente”.

“Ademais, resta patente o periculum in mora, diante das consequências irreversíveis que advêm das Contratações de Organização Social para administrar os hospitais de gestão estadual – Hospital Estadual Dirceu Arcoverde – HEDA (localizado no município de Parnaíba), Hospital Regional de Campo Maior (localizado no município de Campo Maior-PI) e Unidade de Saúde Integrada do Mocambinho – UIM (localizado no município de Teresina-PI) – pela Secretaria Estadual de Saúde – SESAPI, as quais estão na iminência de ocorrer diante da data de abertura das propostas”, entendeu.

Afirmou que “a concessão de liminar inaudita altera pars para sustar atos é uma situação extrema”, mas que se faz necessária no caso, “diante do risco de ineficácia da decisão de mérito”.

“Em sendo assim, como medida de prudência e a fim de afastar a ocorrência de possíveis danos irreparáveis ou de difícil reparação ao erário e/ou ao sistema de saúde [e] à população piauiense, demonstra-se fundamental a concessão da Medida Cautelar, nos termos requeridos pelo Ministério Público de Contas”, decidiu a integrante da Corte de Contas.

 

 

 

Fonte: 180 Graus

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