A mulher de 44 anos resgatada nessa quinta-feira (15) vítima de escravidão moderna por 30 anos em Teresina não possuía amigos e nem convivia com seus familiares. Ela trabalhava todos os dias da semana e nunca concluiu o ensino médio. Ao g1, o procurador-chefe do Ministério Público do Trabalho (MPT-PI), Edno Moura, relatou como a trabalhadora doméstica chegou em Teresina e como era a sua vida.
A chegada na capital
A vítima residia no estado do Maranhão e veio para Teresina aos 14 anos. A mulher perdeu a mãe ainda jovem e seu pai a deu para uma família. O intuito é que ela viesse para o Piauí para estudar.
A trabalhadora doméstica passou foi morar na casa de uma mulher, onde trabalhou como doméstica por três a quatro anos. Em seguida, a patroa entregou a trabalhadora para a própria nora. Nessa casa, onde a vítima foi resgatada nesta quinta (15), ela passou 27 anos.
Rotina exaustiva, sem estudos e sem convivência social
De acordo com o procurador-chefe, às vezes, a vítima recebia uma quantia entre R$ 200 e R$ 300, mas, no geral, ela trabalhava sem remuneração.
“Ela trabalhava todos os dias da semana, primeiramente, cuidando dos filhos da patroa, fazendo a limpeza da casa e comida. Os filhos foram crescendo, ela continuou fazendo a limpeza da casa, levava eles para a escola, cuidava dos dois cachorros”, disse Edno Moura.
A mulher não tinha convivência com a família. Desde que se mudou para Teresina, ela perdeu o contato com o pai e, ao longo desses 30 anos mantida em situação análoga à escravidão, a vítima visitou as irmãs que moram em Arame (MA) somente três vezes.
Além disso, ela não tinha amigos. A mulher saía somente para ir à igreja ou para comercializar produtos que eram confeccionados pela própria patroa, como peças artesanais.
A vítima dormia em um quarto, mas não tinha um móvel para guardar os pertences pessoais. “Os pertences ficavam em uma caixa e uma mala que ela tinha umas roupas, que não usava com tanta frequência, ela colocava na casa do cachorro”, comentou o procurador.
Com quase 45 anos, ela estava matriculada no 3º ano do ensino médio, mas não conseguia frequentar regularmente a escola ou realizar as atividades extracurriculares devido à jornada exaustiva de trabalho.
“Se você está totalmente desgastado por conta do trabalho desenvolvido, você não estuda. Você pode até frequentar a escola. No caso dela, ela não tinha como estudar nessas condições”, explicou Edno Moura.
Vítima não tinha noção que era explorada
O procurador-chefe revelou que a trabalhadora doméstica não tinha noção que vivia em condição análoga à escravidão.
“Você achar que está recebendo um favor, que está sendo favorecido porque a pessoa te deu um abrigo e te alimenta, muitas vezes, principalmente quando ocorre desde cedo, você acredita que é necessário trabalhar mesmo para você retribuir de algum modo aquela benevolência que está recebendo da patroa. Esse é o sentimento que ocorre sempre nessas situações, de gratidão e de que você não está sendo explorado”, finalizou Edno Moura.
As pessoas responsáveis por mantê-la nessa situação foram autuadas e serão obrigadas a pagar direitos trabalhistas, e podem ser processadas por danos morais. Segundo a Polícia Federal, os responsáveis ainda podem ser presos.
Fonte: g1 PI